quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Autismo, Análise do Comportamento e disputas de mercado


                Três artigos na seção Tendências/Debates da Folha de São Paulo tratam de abordagens para o tratamento de crianças autistas. Nilde Franch escreveu “Autismo e Psicanálise” em 13 de setembro de 2013, Del Rey, Vilas Boas e Ilo escreveram “Análise do Comportamento e Autismo” em 25 de outubro, e Vera Regina Fonseca escreveu a tréplica, Questão Complexa, Abordagem Ampla”, em 19 de novembro. Os três textos só esclarecem quem não precisa ser esclarecido. Os argumentos parecem mais voltados para uma disputa de mercado, do tipo “Minha abordagem lava mais branco”. Como o texto da Dra. Vera Regina Fonseca pretende resumir, ressaltar ou rechaçar argumentos dos anteriores, comento aqui partes de seu artigo.
                No autista, o resultado é uma dificuldade básica em se relacionar com as pessoas, o que o impede de usar a ligação com os pais para a regulação emocional..”. Isso não é um  fato; trata-se no máximo de hipótese de trabalho, algo a ser comprovado empiricamente. Será mesmo que a “mãe-geladeira”, a mãe que rejeita o bebê e não estabelece laços emocionais com a criança é uma das causas do autismo? Se isso é fato, como detectar a futura mãe-geladeira nas mulheres grávidas? Como prepara-las, por meio de terapia, para a futura tarefa de cuidar do bebê humano?
                Por meio de recursos técnicos próprios, o trabalho psicanalítico objetiva reativar os caminhos do desenvolvimento relacional e compartilhar estratégias com os pais. Aviso aos distraídos: a autora não está falando do método terapêutico psicanalítico associado ao termo Psicanálise. Trata-se de  psicoterapia convencional baseada na teoria psicanalítica da personalidade. Para uma avaliação de resultados há que descrever quais são os métodos técnicos próprios, dizer como constatar empiricamente a reativação dos “caminhos do desenvolvimento relacional” e descrever as estratégias a serem compartilhadas com os pais. Atacar essa abordagem “psicanalítica” do autismo achando que se trata da técnica tradicional desenvolvida por Freud é dar um tiro no pé.
                Um dos argumentos da réplica é que as estereotipias do autismo se devem à falta de repertório e de integração. Existe tal déficit, mas ele é secundário ao prejuízo central na capacidade de se relacionar. Outra hipótese de trabalho; não há constatação empírica. O que vem primeiro, o prejuízo central devido ao desenvolvimento atípico do sistema nervoso  ou a falta de interações adequadas com o ambiente físico e social? Ou os dois fatores são secundários a um desenvolvimento atípico da integração dos órgãos sensoriais? Na falta de respostas baseadas em constatação empírica, há que evitar diagnósticos preconcebidos por qualquer teoria e tratar cada caso como se fosse único; a priori nenhuma aprendizagem é impossível.  Lembrem-se que autismo não é nome para diagnóstico, apenas resume o que se entende por um espectro que abrange uma variedade de “sintomas” ou “comportamentos inadequados”.
                                “... não é possível uma “religião” que determine a exclusão da psicanálise de um campo no qual ela tem 90 anos de experiência, já que Melanie Klein trabalhou com sucesso uma criança autista na década de 20, antes até da descrição feita por Leo Kanner.”  Parece que a “religião” mencionada é a Análise do Comportamento. Reconheço que um ou outro analista do comportamento dentre os que conheço costuma se apresentar como profeta, mas lembro que a exigência de comprovantes empíricos do resultado da terapia não foi inventada por nós. Isso é coisa do povo americano, que costuma cobrar resultados daquilo que é feito com o dinheiro deles.
              Caio Miguel, analista do comportamento  brasileiro radicado nos Estados Unidos, internacionalmente reconhecido como especialista em autismo, recomenda os sites a seguir para obter informações sobre as vantagens da abordagem:

http://www.nationalautismcenter.org/nsp/
além do documentario sobre psicanalise e autismo. http://www.youtube.com/watch?v=8vZk1soZAC0


João Claudio Todorov, analista do comportamento, é Professor Emérito e Pesquisador Associado da Universidade de Brasília.

                

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

AINDA SOBRE ANIMAIS USADOS EM PESQUISA

Transcrevo texto de especialista a mim enviado pela internet:




https://mail.google.com/mail/ca/u/0/images/cleardot.gif
Texto de Rogério Pietro Mazzantini
Como profissional da área de saúde com experiência em pesquisa, sinto-me na obrigação de esclarecer alguns aspectos dos testes realizados em modelos animais, especialmente porque a falta de informação pode levar a conclusões enganosas.

A legislação brasileira não permite testes de medicamentos e cosméticos em animais, ela os EXIGE. E é assim na maioria dos países desenvolvidos.

O caso da “geração talidomida” no final dos anos 50 é um bom exemplo para entender o motivo da existência de testes em animais. A talidomida é um medicamento lançado na Alemanha com indicação para combater o enjoo em mulheres grávidas. Naquele tempo, os testes em seres vivos eram pouco rigorosos, por isso a talidomida não foi testada em animais durante a gravidez. Como resultado, milhares de mães que usaram o medicamento enquanto esperavam bebês deram à luz crianças sem pernas e/ou braços, daí o nome de focomelia (de foca) para aquele tipo de deformidade. Mais de 10 mil crianças foram afetadas.

Para impedir ou reduzir os riscos de que casos assim se repitam, são usados modelos animais controlados por Comitês de Ética em Pesquisa Animal.

Nenhum medicamento ou cosmético pode ser comercializado sem que antes passe por estudos de diversas fases, sendo as primeiras em animais e, depois de constatada uma relativa segurança, em humanos.

Por isso, essas listas de empresas que “não usam animais para testes” só podem ser lamentadas. TODO cosmético ou medicamento industrializado passou por testes em animais, nem que tenham sido feitos em empresas terceirizadas em outros países apenas na fase inicial de pesquisa. Do contrário, não estariam no mercado.

Assim, por pura coerência, os ativistas de defesa dos animais talvez pudessem repensar o uso que eles fazem de cosméticos, maquiagens, batons, cremes de barbear, xampus, protetores solares, pastas de dente etc. Além disso, se eles realmente querem boicotar empresas que usam animais para testes, poderiam começar deixando de tomar qualquer tipo de remédio registrado, inclusive todas as vacinas, como BCG, tétano, sarampo, meningite, poliomielite etc.

Maus tratos a animais devem ser denunciados e PROVADOS, lembrando que foto em rede social não prova nada. A legislação é muito mais rigorosa com isso do que com maus tratos a crianças...

A informação é esta. O que cada um vai fazer com ela, vai da própria consciência.


ANIMAIS USADOS NO ENSINO

Em artigo publicado na revista online Comportese:,


Carlos Augusto de Medeiros escreve contra o uso de animais no ensino e na pesquisa. Sem mencionar a instituição, fala de seu arrependimento por ter no passado ensinado no IESB com o uso de animais. Talvez traído pela memória diz : “Infelizmente, aquela instituição onde trabalhávamos havia investido uma boa soma em caixas de Skinner importadas e voltamos a usá-las para o azar de muitos ratos."
                Surpreso com a afirmação, pois à época eu era Coordenador do Curso de Psicologia do IESB e sei muito bem que não foi isso que aconteceu, pedi a opinião do Prof. Márcio Borges Moreira, parceiro do Prof. Carlos Augusto de Medeiros no livro que usavam para ensinar Análise do Comportamento. Transcrevo a seguir os comentários do Prof. Márcio:



Não resta dúvida de que questões éticas em pesquisa e ensino, não só com animais, mas também com humanos são essenciais para o desenvolvimento dessas áreas. No entanto, tenho deixado a discussão sobre ética (com humanos também) e pesquisa com animais para outras (muitas) pessoas - principalmente em Psicologia, pois acho, como colocado pelo senhor, que há muita hipocrisia, além de não haver uma base clara para a discussão. Outro problema: as pessoas parecem “perder o bom senso” ao ouvir a palavra pesquisa. Não posso fazer uma pesquisa confinando humanos, com a permissão deles, no lab. e pagando por isso, mas posso fazer exatamente o mesmo se chamar de reality-show! O pai pode presentear o filho que foi bem na escola, mas não posso dar brinquedos para uma criança em uma tarefa experimental que não apresenta nenhum risco físico ou psicológico; posso pagar alguém para trabalhar em condições insalubres em uma mina de carvão, mas não posso pagar alguém para participar de uma tarefa experimental com papel e caneta - apenas para citar alguns exemplos.

Quanto ao que foi dito do IESB, o que está errado é dizer "Infelizmente, aquela instituição onde trabalhávamos havia investido uma boa soma em caixas de Skinner importadas e voltamos a usá-las para o azar de muitos ratos."

Para sorte de muitos alunos, voltamos a utilizar as caixas de Skinner. O desenvolvimento dos softwares, desde o início, foi para resolver o problema naquele semestre. Os resultados foram tão bons que decidimos usar os softwares com humanos como atividade extra. Salvo engano, não demos continuidade porque seria muita coisa para um semestre. Preferimos ficar com os ratos. Uma coisa que ninguém está comentando é que com o comportamento humano acontece muito mais coisa do que com o rato (efeito de história e controle por regras, por exemplo). Esse me parece um ponto chave para a discussão.

Contrariando minha regra de não fazer comentários sobre essas questões, abaixo estão  alguns comentários rápidos sobre alguns trechos do texto do Guto:

"Porém, não resta dúvida de que muitas pesquisas com esse perfil utilizam animais de forma desnecessária, produzindo um conhecimento com manipulações tão específicas de variáveis que nunca poderia ser generalizado para humanos."

Qual a base empírica para essa constatação? De alguma forma o senhor já contra-argumenta isso no seu texto.

"A velha desculpa do conhecimento pelo conhecimento não é suficiente para justificar, em absoluto, a exposição de animais não humanos a um sofrimento desnecessário."

Esse é um ponto que não vale a pena discutir: o conceito de "desnecessário" invalida a discussão. Mesmo chegando-se a um acordo de que há sofrimento, pelo menos em algum grau, fica um "eu acho necessário (justificável) e você não, e aí?"

"Mesmo que as pesquisas com não humanos produzam conhecimentos úteis na descrição do comportamento humano, ainda cabe a questão: o que torna a vida de um animal mais dispensável que a de um humano?"

Essa é uma pergunta absolutamente profunda e filosófica! Mas supondo que haja apenas duas respostas possíveis, nada ou "algum coisa", eu diria que se a resposta for "nada", toda a cultura e modo de produção de boa parte do mudo tem que mudar: animais para tração, alimentação - o próprio animal -, sequestrar os filhos da galinha para fazer omelete, jogar inseticida para matar ratos em casa, pegar nas tetas da vaca sem a permissão da mesma para extrair seu leite, arrancar sem dó nem piedade uma pobre tilápia de seu habitat natural para jogá-la na frigideira, etc.. Ah! E os deliciosos camarões? Pobres crustáceos! Deram azar de não serem mamíferos. Aliás os defensores dos animais, ou pelos menos grande parte deles, deveriam ser chamados de defensores dos mamíferos. E os insetos, que compõem o maior e mais largamente distribuído grupo de animais do mundo? O que fazer com seus zunidos e picadas? E o bicho-da-seda? Pobre ser subserviente cuja única função nesse mundo é nos servir para que não andemos pelados!

"Os sujeitos não humanos de pesquisa são gerados para passar a vida toda em uma gaiola que mal comporta as suas dimensões; pouco interagem com outros de sua espécie…"

Assim como a maioria dos bichinhos de estimação… 

"Os experimentos didáticos são replicações de estudos de mais de meio século. Esses experimentos já foram filmados e estão disponíveis em diversas mídias, inclusive no Youtube."

Se for só para ver, tudo bem, mas o importante não é a demonstração, e sim a prática do aluno. Eu mesmo sou responsável por boa das filmagens disponíveis hoje no Youtube. Complementam, mas não substituem a prática.

"Em primeiro lugar, os experimentos costumam ser feitos em grupos, nos quais há divisões de tarefas."

Um problema operacional do professor com grandes turmas não invalida a relevância das práticas com animais e permaneceria com a prática com humanos.

"Se nós somos analistas do comportamento e gostamos de bichos, devemos, pelo menos na nossa alçada, contribuir para o fim de sua exploração."

Particularmente penso que a questão não tem relação nenhuma com gostar de bichos ou com ser analista do comportamento.

Enfim, abusos existem e devem ser combatidos com agilidade e força. No entanto, generalizar todo o uso de animais em pesquisa como abusivo ou desnecessário já é demais. As respostas, de ambas as partes (dos prós e dos contras), talvez não sejam de utilidade porque a pergunta, pelo menos no momento, está errada (devemos fazer pesquisas com animais ou não?). Seria mais producente fazer perguntas como “quais as alternativas?”, “há estudos que possam validar a eficácia da alternativa?”, “é possível se fazer estudos para descobrir alternativas?”, "como desenvolver métodos que nos ajudem a pesar de forma um pouquinho melhor se os benefícios de uma pesquisa justificam seus procedimentos?".

Não havendo no momento alternativas, deveria ser questionado se um determinado uso específico de animais em pesquisa segue ou não padrões internacionais. Se segue, e ainda assim se considera errado, o primeiro passo seria questionar os próprios padrões e os órgãos responsáveis por eles, e não fazer apelos passionais para aqueles que realizam seus estudos seguindo todas as regras de cuidados com os animais. 


USO DE ANIMAIS EM PESQUISA E ENSINO E HIPOCRISIAS

Venho usando animais em pesquisas há quase 50 anos. Meu primeiro rato não tinha nome, a tarefa era obrigatória em disciplina obrigatória e eu já estava estagiando no que me interessava, organizações. Mas o rato sem nome e eu nos demos tão bem que fui convidado para monitor da disciplina, seguido por um convite para ser instrutor na nova Universidade de Brasília.
         Ainda na USP batizei meu segundo rato de Brasilino. Estava preparando um encadeamento de 22 passos para uma demonstração para alunos da UnB. O Brasilino e seu equipamento seriam levados para Brasília no primeiro semestre de 1963, mas como sempre acontece nossa mudança só ocorreu em maio de 1964. Em um mês o novo rato, Brasilino II, foi preparado para uma exibição na reunião de Ribeirão Preto da SBPC. Viajamos juntos de Brasília para Ribeirão, ida e volta, o Brasilino II levando  seu equipamento para exibições públicas. Os Brasilinos I e II ajudaram a introduzir a Análise do Comportamento no Brasil.
         Trabalhei muito com pombos e ratos em pesquisas que são citadas até hoje, em áreas como comportamento e contexto (comportamento é escolha, escolha é comportamento), generalidade das leis da aprendizagem ( a priori nenhuma aprendizagem é impossível) e parâmetros de estimulação aversiva (que até hoje servem para balizar o uso ético em pesquisas). São pesquisas básicas que subsidiam o desenvolvimento de estratégias para os trabalhos aplicados aos problemas humanos. Só negam essa importância aqueles que não aceitam a continuidade de processos comportamentais na escala evolutiva; os criacionistas, por exemplo.
         Por outro lado, há analistas do comportamento que são contrários ao uso de animais no ensino. Provavelmente são os que usam estratégias, métodos e técnicas sem saber como se desenvolve a teoria, e os que trabalham em instituições que não estão dispostas a investir em equipamento e custeio. Esses professores, quando vão a congressos, costumam ser assediados pelos donos e vendedores de softwares que substituem os ratos vivos por ratos virtuais. Para fins de ensino, é o equivalente aos cursos que ensinam estudantes de enfermagem a dar injeção em laranjas.
         A intenção de evitar sofrimento desnecessário aos animais é louvável, por isso temos os comitês de ética na pesquisa para examinar projetos. Só não vale hipocrisia. Nem acusar os colegas de torturadores hipócritas. Comer bife ou frango assado sem se preocupar com as condições de criação e de matadouros e abatedouros e reclamar do uso de animais em pesquisa e ensino é hipocrisia. E comer baby beef e vitela é apoiar o infanticídio...

 

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

COMO DEFINIR COMPORTAMENTO?

            Os homens agem sobre o ambiente modificando-o (comportamento) e são modificados pelas consequências dessa ação sobre o ambiente (consequência).  Essa frase de B. F. Skinner é simples, direta e poderosa. Claramente identifica uma interação comportamento-consequência. Como é possível, então, definir comportamento como a interação organismo-ambiente? Autores que usam “comportamento” como sinônimo de “comportamento operante” sem avisar o leitor escrevem que comportamento é a interação organismo-ambiente, consubstanciada na contingência tríplice situação-resposta-consequência. Substituindo “comportamento” por essa definição temos: (A interação organismo-ambiente) é a (A interação organismo-ambiente)- consequência; um absurdo do tipo A é igual a A+B.
            Comportamento é muito mais que o operante (operante é uma das formas de comportamento). Sua definição como a interação da qual faz parte parece vir de uma confusão entre efeito e consequência. Um mero movimento de mão tem como efeito o deslocamento do ar, alguém acenando de volta é a consequência. Falar “bom dia” tem como efeito a produção de ondas sonoras, alguém responder “bom dia” é a consequência. Na linguagem leiga identificamos comportamentos por seus efeitos no ambiente e explicamos esses comportamentos por suas consequências. Entretanto, a definição usada por muitos analistas do comportamento toma efeito por consequência. A confusão parece vir da definição de reflexo por Skinner e por Keller & Schoenfeld. No comportamento reflexo a resposta não pode ser definida sem o estímulo eliciador, nem o estímulo sem a resposta eliciada. O equivalente no comportamento operante é a relação comportamento-efeito, não a relação comportamento-consequência.
Sobre efeito e consequência: correr é comportamento, certo? É definido pelo deslocamento rápido no espaço. Não preciso saber a causa para dizer que correr é comportamento. Já fuga, exercício, alcançar o ônibus são operantes definidos pela função da corrida.


            Dizemos que a criança está gritando pela intensidade do som produzido (efeito); dizemos que é birra pela consequência – o grito cessa quando a mãe dá atenção à criança. A consequência qualifica (birra) uma definição mais ampla (gritar). O grito é o comportamento, o qual é qualificado pela interação comportamento-consequência. Exemplos semelhantes são milhares: girar a maçaneta (comportamento), abrir a porta (operante);  correr (comportamento), pegar o ônibus (operante); correr (comportamento), fugir da chuva (operante), falar (comportamento), mentira (operante).

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

SOBRE PSICOTERAPIAS

Psicoterapia versus Psicofarmacologia
            Drogas não produzem comportamento. Psicotrópicos atuam no sistema nervoso, aumentando ou diminuindo indiretamente a frequência de comportamentos pré-existentes, alterando condições que fazem parte de interações comportamento-ambiente, como nível de ansiedade. Isoladamente não têm efeito duradouro, mas produzem importantes efeitos indiretos. Essa parece ser a razão para que o tratamento com psicofármacos ser mais frequente que o tratamento psicoterápico. A psicoterapia não vê o comportamento como sintoma,  vê como parte da convivência da pessoa com seu meio social. Nós somos hoje o resultado de escolhas que fizemos e de escolhas que fizeram por nós. Entender o que ocorre ao seu redor é resultado de aprendizagem, por isso psicoterapia leva tempo; maior ou menor dependendo do objetivo (há casos bem sucedidos nos quais uma psicoterapia estruturada de 20 sessões resolveu o problema).
            Dados recentes de pesquisa nos Estados Unidos mostram aumento de tratamentos mistos e diminuição de tratamentos psicoterápicos sem uso de fármacos. Esse aumento na abordagem médica não tem que significar aumento na eficácia do tratamento. O uso de Ritalina por crianças hiperativas, por exemplo, diminui a hiperatividade das crianças apenas enquanto ativa no organismo, mas diminui e muito a ansiedade dos pais. Não resolve, mas dá um descanso para a família e mais chance de interagir proveitosamente  com o ambiente social.

            Se a psicofarmacologia resolve só a curto prazo (o efeito da droga é eterno enquanto dura... ), a psicoterapia precisa de tempo, podendo complicar a curto prazo (sentimento ilhado, morto e amordaçado, volta a incomodar – com agradecimentos ao Fagner). Como a psicoterapia afeta todas as esferas da vida, não é de se estranhar a existência de tantas abordagens, algumas centrando só nas relações do presente, outras buscando razões no passado via lembranças desencavadas, outras no equilíbrio e bem estar do organismo, etc. A atual exigência do governo norte-americano de constatação empírica de sucesso antes de dar mais verbas para esta ou aquela abordagem levou a A American Psychological Association a constituir grupo de trabalho para avaliar pesquisas que atestam esses comprovantes de eficácia. O esforço do APA é louvável; o Golias que é a indústria farmacêutica investe muito em pesquisa todos os anos. Do lado da Psicologia é recente a preocupação com demonstração de resultados, uma tradição da Análise do Comportamento.

RESPOSTA A ROSELY SAYÃO SOBRE O CANTINHO DO CASTIGO

Cara Rosely,
Parabéns pela coluna “Cantinho do Castigo”. É muito importante usar uma coluna tão lida para alertar mães, pais e cuidadores sobre o uso indiscriminado de estratégias comportamentais na educação de seus filhos. Mas também é importante ser acurado na nomeação de estratégias. Usar adestramento, condicionamento, controle, como características de uma psicologia comportamental é deseducar o leitor. Não sei a qual psicologia comportamental você se refere, mas certamente não é a Análise do Comportamento (comportamental virou adjetivo atraente, usado para dar upgrade a outras marcas).
         É sempre arriscado transformar em técnicas de fácil manejo aspectos de estratégias terapêuticas, como por exemplo,  a popularização de interpretações “psicanalíticas”. É o caso mencionado em “Cantinho do Castigo”, sobre ser comum na internet “artigos, blogs, reportagens com listas e recomendações aos pais para bem educar os filhos”. O uso indiscriminado do time-out descaracteriza qualquer abordagem educativa e/ou terapêutica. Time-out quer dizer, em bom português, suspensão temporária sinalizada das consequências que mantêm uma interação. No exemplo da coluna a birra da criança ocorre na presença dos pais ou cuidadores. Nunca se viu ou ouviu birra quando a criança está se divertindo com seu vídeo-game favorito. A birra ocorre quando uma demanda não é atendida ou quando os adultos não lhe dão atenção. Birra é aprendida. A voz da criança tende a aumentar de intensidade, até virar berro, quando somente seus gritos recebem a atenção  da mãe. Só colocar a criança no “cantinho do castigo” não resolve, mesmo que venha com a ordem para refletir sobre o que fez. Remover a criança da sala resolve temporariamente o problema da mãe, não o problema da relação mãe-criança.
         Qualquer forma de punição é indesejável, é algo a ser evitado sempre que possível. Essa é uma das principais mensagens  da Análise do Comportamento. Quando é inevitável, o time-out é a forma mais branda de punição. Se a birra é mantida pela atenção da mãe, o que se recomenda é dar atenção à  criança de forma a evitar situações nas quais a criança só consegue atenção berrando. Isso envolve a educação de mães, pais, cuidadores, para uma boa interação com a criança. O que não quer dizer elogiar todo bom comportamento e punir todo comportamento indesejável. A Análise do Comportamento não programa robôs.
         Remédios embalados em caixas com faixa vermelha são vendidos apenas com receita médica. Sem a orientação de um analista do comportamento técnicas como o time-out são tão ou mais perigosas que muitos remédios. Divulgações irresponsáveis como as que você acusa deveriam também vir com uma advertência ao público: “O uso indiscriminado destas técnicas é prejudicial às suas relações interpessoais”.

João Claudio Todorov
Professor Emérito e Pesquisador Associado do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Comportamento da Universidade de Brasília



RESPOSTAS A PERGUNTAS SOBRE A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ANÁLISE DO COMPORTAMENTO

Estas respostas às perguntas frequentemente encontradas no Facebook foram escritas e largamente divulgadas semanas antes da reunião anual da ABPMC. A mudança no estatuto da ABPMC ocorreu em assembleia que se reuniu em Fortaleza, incorporando vários aspectos do estatuto da Associação Brasileira de Análise do Comportamento. A seguir a íntegra das respostas que escrevi.

1-     A apresentação da proposta de uma nova Associação pegou todos de surpresa. Qual o cenário que os motivou a propor uma nova Associação?

Pegou de surpresa quem não acompanhou o trajeto da ABPMC ao longo dos últimos 22 anos. A ABPMC cresceu com uma reunião anual, a publicação dos anais em forma de livro na bem sucedida coleção Sobre Comportamento e Cognição, e na publicação da Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva. Os títulos dos livros e da revista bastam para mostrar que a ABPMC era e é uma associação mais ampla que uma de analistas do comportamento. Há vinte e dois anos que a maioria de analistas do comportamento colabora para o fortalecimento da terapia cognitiva e outras abordagens não-comportamentalistas.

2-     A proposta apresentada pelos senhores não poderia ser contemplada pela ABPMC? Por que então uma nova associação?

Poderia ser se não fosse o que é. Com a obrigação da reunião anual e as publicações e sem estrutura profissional não sobram tempo nem recursos para a diretoria desenvolver as atividades previstas no estatuto da ACBr, uma associação exclusiva, de e para analistas do comportamento.

3-     Há quanto tempo os senhores têm discutido a proposta da ACBr? Porque só agora, às vésperas do conhecido evento da ABPMC?

Pelo menos desde maio de 2003 quando a ABAI se preparava para fazer no Brasil seu congresso internacional em 2004. De lá para cá a ABPMC recusou-se a se relacionar formalmente com a entidade internacional (que só aconteceu por esforço pessoal de Martha Hubner), recusou a proposta de divisões regionais, e continuou a ser principalmente uma associação de terapeutas, comportamentais ou não.  Enquanto isso o campo de atuação profissional do analista do comportamento é invadido por pessoas sem formação que se dizem especialistas. Três reuniões para tratar do assunto que aconteceram no primeiro semestre deste ano nos convenceram que a ABPMC, por sua composição e sua história, nunca seria uma associação só e para analistas do comportamento, psicólogos ou não.

4-     Nas redes sociais foi aventado que a estruturação da ACBr não teve transparência. O que os senhores têm a dizer aos nossos leitores?

Um anúncio da intenção foi amplamente divulgado. A receptividade ao anúncio levou à elaboração, aprovação e publicação dos estatutos com regras claras para associação de interessados. Eleitos uma diretoria e conselho uma assembleia pode ser convocada para ratificar ou retificar esses estatutos. Quem acha que é mais transparente e democrático convocar primeiro uma assembleia e nela começar a pensar os estatutos pode tentar esse caminho.

5-     Porque foram escolhidos somente cinco “figuras” ou “personalidades” para discutir um estatuto que representará toda uma comunidade?

A pergunta é ofensiva. Os analistas do comportamento que aceitaram a tarefa foram escolhidos por sua experiência e competência e não merecem ser desmerecidos por termos como “figuras” e “personalidades”. Além de ofensiva é equivocada. Que comunidade?  A ABPMC não representa mais que a comunidade de seus associados (behavioristas ou não). A ACBr só vai falar em nome de seus associados (analistas do comportamento). A pergunta se refere a qual comunidade? Uma potencial que incluiria todos os que anunciam inserindo a palavra ”comportamental” em seus anúncios, como se vê em sites na internet do tipo “Fulano, analista do comportamento, especialista em terapia cognitivo-comportamental”?

6-     No início havia um representante das práticas analítico comportamentais aplicadas à educação especial. Esse representante saiu da comissão e não foi reposto outro representante. No estatuto é possível observar que não há mais essa representação. O contexto inicial dessa representação esteve ligado à discussão sobre certificação de analistas do comportamento? Se sim, porque essa representação foi retirada do estatuto aprovado?

Porque a ACBr é associação de analistas do comportamento, não só dos que trabalham com educação especial. Estava porque foi colocada por alguém que trabalha com autismo e foi retirada porque seria muito extenso colocar todos os outros campos de atividade do analista do comportamento.

7-     Há alguma “rixa” entre os proponentes da ACBr e a diretoria da ABPMC? O que houve nos bastidores para que os senhores propusessem a ACBr?

Não há rixa. Somos todos associados da ABPMC e da SBP. Alguns são Conselheiros. das duas associações. Falamos a mesma língua nos bastidores e no palco. Divergências não têm que levar a inimizades.

8-     Na opinião dos senhores a principal oposição da ABPMC em relação à ACBr seria em relação à certificação de analistas do comportamento?

Não. Essa questão foi colocada pela ABPMC na reunião de Salvador. Não há como saber de que maneira a assembleia da ACBr  eventualmente vai se manifestar sobre isso. É uma questão muito mais delicada que envolve uma disposição latinoamericana de evitar um controle americano do credenciamento no mundo.

9-   Alguns acreditam que uma Associação restritiva iria enfraquecer a representatividade da Análise do Comportamento no cenário nacional. O que os senhores pensam sobre essa crítica? Isso não poderia gerar uma versão brasileira da Análise do Comportamento?

Não. Só vai aumentar a representatividade e a força política. Quantas associações se originaram na ABPMC e se tornaram independentes sem prejudicar seu futuro?  Só de Campinas foram duas. A Associação Brasileira de Terapia Cognitiva é outra. A ACBr vem fortalecer a análise do comportamento e, por tabela, a ABPMC enquanto ela for também de analistas do comportamento.
Uma análise do comportamento versão brasileira é aquela desenvolvida por quem só publica em português, só lê textos em português de quem não acompanha o que acontece no mundo. Não é o caso da ABPMC nem será o caso da ACBr.

11-   No passado houve uma associação de análise do comportamento brasileira, mas a ideia ruiu. Porque os senhores acreditam que nesse momento, a nova associação irá ser replicada?

A ACBr não se responsabiliza pelo que aconteceu há mais de vinte anos. Por que a ABPMC matou a ABAC? Perguntem a quem estava lá.

12-   É de conhecimento geral que há dificuldades no estabelecimento de grupo diretor, as grandes personalidades da análise do comportamento normalmente não se comprometem com o volume de trabalho em tocar uma associação, ABPMC sofre desse mal. Isso também não ocorrerá com a ACBr?

Vejam a diferença na estrutura diretiva determinada pelos estatutos. A ABPMC nasceu como uma reunião anual, informal, de modificadores do comportamento. Sem sede, sem contador, sem livro caixa, sem CNPJ. Os auxílios à FAPESP eram pedidos por pessoa física, um pesquisador que depois prestava conta. O processo de formalização da ABPMC é recente e comprova como práticas culturais estabelecidas são resistentes à mudança.

13-   Houve grande comoção nas redes sociais em relação à proposta, muitos apareceram para se posicionar como se estivessem em defesa da ABPMC. O que os senhores acham que motivaram essas pessoas, porque tanta comoção diante de uma proposta como a da ACBr?

Porque importantes personalidades históricas da ABPMC se sentiram ameaçadas e levaram sua inquietação para a internet. Só o tempo vai acalmar os respondentes eliciados pelo lançamento da ACBr. Foi o que aconteceu na SBP quando a Associação de Modificação do Comportamento (Precursora da ABAC e da ABPMC) foi criada há décadas.

14-   Constantemente é discutido nas redes sociais que a ACBr ou seus proponentes deveriam discutir a nova associação no evento da ABPMC, mas os senhores declinaram dos constantes convites. Porque não discutir a ACBr durante o evento da ABPMC?

Porque não se trata de criar divisão ou departamento da ABPMC. Discute-se a criação de nova associação com quem quer associar-se. Como queremos continuar trabalhando em conjunto, anunciamos a criação da ACBr em correspondência formal aos Presidentes da SBP e da ABPMC.