quarta-feira, 16 de julho de 2014

Futebol, eleições e relações de equivalência.


Tanto o governo quanto a oposição estavam preparados para o período pós-copa. Nos dois casos a questão é a de relações de equivalência. O governo vinha investindo em garantir a associação entre a futura euforia trazida pelo hexacampeonato e a imagem de sua candidata a presidente. A oposição vinha tentando diminuir a reação positiva gerada por notícias da Copa relativizando sua importância para um país carente de educação, saúde, transportes, segurança, infraestrutura, etc. A goleada, tão horripilante quanto inesperada, serviu como um intervalo para que os times políticos trocassem de campo. Agora interessa ao governo relativizar a derrota. No mesmo dia dos 7 a 1 um conhecido petista fez um selfie com a camisa vermelha, sorridente, dizendo não foi nada, isso passa, olha  nós aqui. Inúmeras postagens, nesse dia e nos outros, até agora, batem na mesma tecla. Como se tivessem combinado as regras do jogo, a oposição faz o inverso, reforçando a associação estabelecida no “primeiro tempo” pelo próprio governo entre sua candidata e a Copa, só que agora com todos os aspectos negativos do fracasso. Essas estratégias antagônicas poderiam ser chamadas de “Deixa pra lá” e “Foi ela sim!”, respectivamente.
Um texto em um blog dá um bom exemplo da estratégia “Deixa pra lá”: não vou chorar com os 7 a 1 porque a derrota não foi minha, foi deles. Não há nada de novo nessa fuga do mal estar provocado pela goleada, mesmo porque só quem é torcedor sente o vexame – torcer envolve respondentes, não há papo operante que segure a dor de um 7 a 1. Essa fuga pode até ser parte do contexto de quem curte futebol diariamente, e talvez seja a explicação para os que só se ligam no futebol a cada quatro anos, mas afirmar isso é não reconhecer a importância de pertencer ao grupo, de vestir a camisa mais que figurativamente. Um exemplo de torcedor de verdade, controlado por respondentes, é o flamenguista que contra seus pendores políticos e ideológicos torceu contra a Argentina, pois aquela camisa da Alemanha lembra demais o “manto sagrado” rubro-negro.
Propagandas da oposição do tipo “Foi ela sim!” dizem que agora o futebol se igualou à educação, à saúde, à segurança, etc.; estamos por baixo em tudo. Perdemos por 100 a 0 para a Alemanha em número de ganhadores do Prêmio Nobel (aliás, nesse quesito perdemos a zero também para a Argentina).

Eu pessoalmente preferiria campanhas políticas menos manipuladoras e mais informativas, e projetos para começar a preparar a nova seleção. O sofrimento recomeça com amistosos no segundo semestre. 

4 comentários:

  1. Concordo.
    Acho que nenhum dos lados está fazendo um "jogo limpo".
    Estou esperando a equivalência entre algum partido e a torcida japonesa.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Eu também, Todorov... muito embora os discursos antes das eleições raramente se alinhem com as práticas adotadas pós-eleições, já que, como afirmou Skinner, as contingências que selecionam os comportamentos antes das eleições são diferentes das pós o processo eleitoral. Na verdade, creio que nem precisemos fazer uma comparação contingencial de períodos diferentes, pois independente do tempo, é evidente a existência contumaz de contingências que selecionam discursos e práticas que raramente se alinham.... para além dos processos eletivos...

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  4. Obrigado pela partilha dos insights e relações bem humoradas entre futebol e eleição. Ajudou-me a tomar consciência de mais alguns elementos. Apesar de jamais termos condição de elencar todos os fatores envolvidos, penso que os aspectos psicológicos foram cruciais para a derrota "gritante".
    abs,

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