Em uma visão skinneriana do behaviorismo
qualquer comportamento humano resulta sempre de três níveis de seleção por
consequências: a pessoa existe como resultado de seleção de genes na história
de espécie humana (seleção filogenética), é socializada para a vida em grupo
segundo um conjunto de regras selecionadas na história da cultura do grupo
(seleção cultural), e adquire seu repertório por meio das interações com seu
meio ambiente ao longo da vida (seleção ontogenética). Logo, o que é
selecionado no nível cultural não é um determinado comportamento: a história
daquele grupo selecionou as regras (contingências
ou relações condicionais) a serem usadas pelas agências de controle para a
modelagem e manutenção de comportamentos.
Dizemos que certos
comportamentos são práticas culturais
quando são frequentes e comuns a várias pessoas e/ou perduram por gerações. São
práticas culturais, mas pertencem ao segundo nível de seleção, ontogenética ou
comportamental. São comportamentos específicos que dependem das consequências contingentes
à sua específica emissão. A regra para reforçar ou não é geral, cultural, mas a
consequência é particular, depende do comportamento da referida pessoa.
Seleção cultural ou
seleção de culturas?
Seleção cultural envolve comportamento de pessoas; seleção de culturas é a seleção das
regras (contingências ou relações condicionais) que orientam a ação das
agências de controle. Não deveriam ser usados como sinônimo.
Seleção cultural se refere à seleção de comportamentos de acordo com
regras vigentes no grupo. Em nossa cultura a criança pode ser elogiada por
lavar as mãos antes de sentar-se à mesa ou pode ser proibida de comer enquanto
não for lavar as mãos, por exemplo. Há mil anos não só não havia o hábito de
lavar as mãos antes das refeições; comia-se levando os alimentos à boca com as
mãos.
Mudanças no ambiente costumam ser responsáveis por alterações nas regras
que caracterizam uma cultura. Comer com talheres foi um hábito que chegou à
Europa por Veneza, vindo da Grécia, mas levou séculos para ser adotado em todos
os países. Lavar as mãos levou mais tempo para ser adotado, só muito depois da
comprovação científica da transmissão de doenças por contato físico. Atualmente
o hábito pode estar se perdendo. Em grandes cidades cada vez mais pessoas comem
nas ruas, nos food trucks, ou em
praças de alimentação do shopping, sem pia para lavar as mãos a menos de
cinquenta metros. Já imaginaram todas as crianças em filas no único banheiro do
andar naquele shopping, esperando para lavar as mãos?
Mudanças na cultura, portanto,
podem ser causadas por mudanças em práticas culturais de pessoas. O jogo Tragédia dos Comuns1 ilustra
as possibilidades de mudanças nas regras seguidas pela agência de controle causadas
pelo comportamento das pessoas que competem por um bem comum. Considere um
pasto comunitário, usado por agricultores que aí colocam suas reses para pastar.
Quantas cabeças colocar, tanto seu lucro. Se cada agricultor aumentar seu
rebanho indefinidamente, o pasto acabará, não haverá condição de renovação
permanente que a pecuária exige. Não há “mão invisível do mercado” que resolva
isso. É do interesse de todos que alguma agência de controle, aceita por todos,
regulamente o uso do pasto comum. Elinor Ostrom2 tem um excelente
trabalho com dados sobre a evolução das agências de controle.
Elinor Ostrom, Governing the Commons: The
Evolution of Institutions for Collective Action, 32 Nat. Resources J. 415
(1992). Available at: http://digitalrepository.unm.edu/nrj/vol32/iss2/6.