sábado, 12 de julho de 2014

O que é consciência?


"Nunca vi fazer tanta exigência
Nem fazer o que você me faz
Você não sabe o que é consciência
Nem vê que eu sou um pobre rapaz"

            Mario Lago,  “Ai que Saudade da Amélia”

“The Cambridge Declaration on Consciousness” é um documento assinado em 7 de julho de 2012 por em pequeno grupo multidisciplinar de cientistas interessados no estudo da consciência em animais. O problema é que não chegaram a um consenso sobre o que é consciência, segundo o idealizador do documento, Philip Low, declarou ao repórter Alex Halberstadt do New York Times.
Consciência é um daqueles termos, como comportamento, que todo mundo acha que sabe o que é, mas cada um usa de maneira diferente. Quando Philip Low e seus colegas chegarem a um consenso sobre a definição volto a escrever sobre isso. Pode demorar, pois até hoje os neurocientistas não chegaram a um consenso sobre o que é “reflexo” e o que é “voluntário”.
            Quando um behaviorista diz que consciência não é explicação, mas um processo a ser explicado, está usando o termo sem negar a importância do que quer que esteja acontecendo no cérebro quando um animal fica imóvel ante um predador, por exemplo. A visão do predador antecede o congelamento e os eventos associados no sistema nervoso. O  conflito entre “se correr o bicho pega” e “se ficar o bicho come” envolve operantes e respondentes, interações entre comportamentos e eventos internos e externos.
            A letra do samba é interessante por mostrar dois sentidos do termo muito comuns em nossa linguagem diária: o estar atento ao que acontece ao seu redor, e o sentido moral. A nova companheira, ao contrário da Amélia, não percebe o mal que faz ao “pobre rapaz”, que infere a falta de consciência pelo que relata do comportamento da moça. A companheira ou realmente não percebe (sentido 1) ou não se interessa pelas consequências, se são ou não socialmente aceitáveis (sentido 2).
Grande parte do que fazemos na Análise do Comportamento, porém, é interpretar eventos internos, como fez Skinner em, por exemplo, “Ciência e Comportamento Humano”, em uma época que as neurociências apenas engatinhavam. Ao contrário do que dizem críticos apressados, não trabalhamos com um modelo “homem-máquina” combatendo um modelo “mente”. Estudamos interações comportamento-ambiente, e o que ocorre por trás da pele (ou sob e na pele) é parte desse ambiente. Ao contrário do espantalho oco pintado pelos que nos criticam, estudamos organismos de carne e osso, muitos nervos, e cheios de desejos, medos, apetites, esperanças, histórias, conhecimentos, e dezenas ou centenas de outros substantivos que a literatura e a arte retratam.
            Talvez não esteja muito claro para esses críticos que quando eu penso para escrever este texto estou me comportando. A diferença é que não aceitamos o pensar em escrever como a causa do escrever. Neste exemplo, pensar e escrever são parte de um encadeamento que é função, dentre outras variáveis de meu contexto, do conteúdo desagradável de um comentário a um texto que escrevi sobre o termo “cognitivo” ser usado às vezes como sinônimo de “comportamental”, ás vezes de “mental”.

http://jctodorov.blogspot.com/2014/07/cognitivo-e-o-novo-mental.html



5 comentários:

  1. Meu caro João Claudio. Como você perguntou no seu título "O que é consciência?" vou responder com uma definição que os analistas do comportamento pouco conhecem. "É a descrição das contingências". Pelo menos como definição de trabalho é útil. Se é descrição é comportamento verbal conforme a definição de Skinner no "O comportamento Verbal". A contingência a ser descrita independe da sua composição e tamanho (eventos pertencentes à contingência). Se é possível descrever os eventos antecedentes, seja publicamente ou privadamente não interessa. É possível descrever. O termo intermediário da contingência de três termos, o comportamento, tbém pode ser descrito. Seja publicamente ou privadamente . O mesmo ocorre com as consequências. Consciência como comportamento verbal publico é mais fácil de ser observado. Privadamente é mais difícil e entra na questão do pensar. Nada de tão difícil, uma vez que, se não se pode observar diretamente, pode-se inferir como um elo de comportamento encadeado onde comportamentos posteriores dependem de pre-correntes anteriores. Portanto tudo observável direta ou inferido de observações diretas. Existem decorrências quando falamos de eventos verbais privados e que podem ser estudados empiricamente através de encadeamento de pré-correntes. Isto nos leva para a questão da correspondência entre Fazer, Dizer e Pensar. A correspondência entre Pensar e o Fazer e Dizer é mais complicada. Mas pode ser inferida. Não sei se você lembra da brincadeira que fazia com meus alunos de graduação em que eu dizia que "iria fazer eles pensarem - uma resposta perceptual ou verbal, depende dos estímulos apresentados." 1-branco, 2- duzia, 3- frito ou cozido, 4- vendido em caixinhas em doze unidades, 5- galinha, 6- granja. Agora vou inferir que você respondeu perceptualmente pensando no objeto(evento) "ovo". dificilmente você "pensou" na palavra ovo. Daí que aqui de Goiânia fiz você emitir um privado perceptual aí em Nova York. A correspondência poderia ser testada fazendo-se um encadeamento onde respostas posteriores só ocorressem caso a resposta perceptual se tornasse pública para a sucessão de elos. Há experimentos sendo conduzidos sobre isto. grande abraço. Loris

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    1. Consciência como descrição de contingências, parece útil sim, mas, nem sempre descreve-se o que se discriminou, algumas vezes apenas se repeti aquilo que já se ouviu, ou seja, a descrição não é resultado de uma discriminação, mas um intraverbal, nesses casos, como evitar erros ao entender e definir o conceito de consciência, e qual sua relação com autoconsciência?

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    2. Realmente se "repete" muito não só o que se ouve mas, também o que se lê e etc... . Você tem que saber que "entender" é um outro operante que vai além de ecoicos. Como você bem disse, pode ser um intraverbal. Ser intraverbal exclui a discriminação? Aí você pesquise sobre intraverbais e não sobre comportamentos cônscios. Cpt cônscio é mais apropriado do que consciência pois indica operantes a serem estudados. Quanto a auto-consciência é termo a ser evitado pois é cpt cônscio, do próprio falante, isto é, você é falante de sua função de ouvinte. Para te ajudar poderia consultar:
      1- Simonassi, L. E. (1999) Cognição: contato com contingências e regras. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva. Vol.1 (1),83-93.
      2- Simonassi, L. E e Cameschi, C. E. (2003). O Episódio Verbal e a Análise de Comportamentos Verbais Privados. Rev. Bras. Ter. Comp. e Cog. V. 5 (2), 105-119.
      3- Simonassi, L.E. e col. ( 2001). Comportamento privado: acessibilidade e relação com comportamento público. psicologia: Reflexão e Crítica. 14 (1), 133-142.
      Juliana. grande abraço do prof. Lorismario E. Simonassi

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  2. Prezado Todorov, Favor corrigir: Ai que saudades de Amélia é de autoria de Mário Lago e Ataulfo Alves!

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  3. Obrigado Danilo. Consultei o Google mas devo ter lido errado.

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