De Lorismário Simonassi
A planária que
comeu a aprendizagem de outra planária.
Scrittore Traditore.
Existe uma grande quantidade de
más informações nas academias. Parece
que na psicologia a frequência é maior.
Este tipo de divulgação é parecido com o que Sergio Porto imortalizou, lá pelos
anos 60, com o título de FEBEAPÁ (FEstival de BEsteiras que Assolam o Pais).
Eram sátiras que, naqueles anos, mostravam as confusões que pessoas faziam ao
misturarem fatos de diversas épocas. Uma das mais famosas foi o samba
intitulado por Stanislaw Ponte Preta-
pseudônimo de Sergio Porto (1968)- de Samba do Crioulo Doido. Voltarei ao
samba.
Comumente,
professores de outras áreas se aventuram a falar sobre o que não sabem. Um
exemplo comumente citado é um pseudo-experimento feito com planárias por Mc Connel (1962). Neste pseudo-experimento a
uma planária apresenta-se uma luz seguida por um choque elétrico.
Posteriormente só a presença da luz é suficiente para que a planária fuja da
presença da luz e evite o choque.. Dá-se então a oportunidade que planárias
canibalizem partes da planária “condicionada”. Afirma-se que a planária
foi condicionada por um procedimento tipicamente Pavloviano ou Respondente.
Posteriormente à planária “canibalesca” é apresentada a uma luz de mesma
intensidade. Esta então passa a fugir da luz e evitar o choque. Diz-se que isto
é um experimento que demonstra que a aprendizagem foi “digerida” pela planária
“canibal” e que o comportamento de fugir da luz e esquivar ao choque foi
transferido para a planária canibal ao ingerir o RNA da planária condicionada.
Alguns comentários:
1-
Não se testou previamente se a planária comelona
já fugia das luzes. Não é preciso, pois estes vermes são fotofóbicos, isto é,
tem respostas de fugir da presença da luz. Elas fogem também da presença de
choques elétricos. Portanto se tivesse sido feita uma Linha de Base, o
experimentador teria que tomar uma de várias outras possíveis decisões, a
saber: 1-trocar a luz por um estímulo neutro relativo à sensitização(sensibilização)
,isto é, um estímulo que não fosse um estímulo incondicionado sensibilizador
pois nos procedimentos Pavlovianos NÂO EXISTE emparelhamento de dois estímulos
INCONDICIONADOS no caso, luz/choque uma vez que já são
sensibilizadores. 2- Trocar de animal, isto é , usar um animal no qual a luz
não fosse um estímulo incondicionado. Por exemplo, um cachorro, pois este
também teria um sistema nervoso mais evoluído do que a planária, pois nas
planárias o sistema nervoso é rudimentar. Por rudimentar, define-se que
possuem “um anel nervoso ligado a
cordões longitudinais ou por um par de gânglios cerebroides”, isto é, tem
funções semelhantes às funções mais elementares de cérebros ainda muito pouco
desenvolvidos. Exemplo, o cerebroide das
planárias é inferior ao das minhocas pois, as minhocas são anelídeos,
organismos superiores aos platelmintos (planárias).
2-
Caso o teste fosse feito em Linha de Base (cf. Sidman, 1960) a planária “canibal” já teria apresentado o
comportamento de fuga. Portanto o que esta planária comeu não foi a aprendizagem,
mas sim proteína.
3-
O delineamento deveria ser feito tipo N=1, n vezes, ou seja, fazer a sequencia de Linha de Base → Emparelhamento de Estímulos →
Linha de Base.
A despeito da vasta literatura sobre
sensibilidade de estímulos (cf. Jenkins, 1977) a divulgação de achados no
mínimo controversos continua a ocorrer. Até mesmo expectativas de “pílulas da
aprendizagem ou memória” são ditas nas salas de aula. Não é novidade, pois foi
o próprio Mc Connell que difundiu a ideia em suas apresentações lá pelos anos
de 1964. Até hoje são esperadas as tais pílulas embora, estudos refutativos por
falta de CONTROLE EXPERIMENTAL sejam vastos na literatura especializada. Por exemplo, Hartry, Keith-Lee e Morton (1964)
replicaram o experimento de MC Connel (1962) e concluíram que:
“os resultados não provam que memória não possa ser transferidas via
canibalismo, porem teorias alternativas que enfatizam ativação e sensibilização podem ter sido as variáveis responsáveis das
respostas de fuga e esquiva nas planárias canibais”.
Desde 1962 até os dias de hoje as tais “pílulas de memória” não
surgiram. Eu faço uma sugestão. Se uma
criança aprendeu a ler é suficiente que gotículas de sangue dessa criança sejam
misturadas com água e açúcar para ser mais apetitosa e distribuída para
crianças analfabetas beberem. Como existem moléculas de DNA e RNA no sangue dos
organismos, o problema da leitura estará resolvido. Enquanto isto os Analistas
do Comportamento irão ensinar seus filhos a ler através das técnicas
convencionais ou quando muito, usar um procedimento de Aprendizagem sem Erro
(cf. Terrace, 1963) ou de Equivalência de Estímulos (cf. Sidman,1982) para que
seus filhos continuem aprendendo a ler caso tenham dificuldade em aprender.
Voltando ao Samba do Crioulo Doido de Stanislaw Ponte Preta desejo
colocar uma pequena parte:
“Foi em
Diamantina onde nasceu JK que, a
princesa Leopoldina arresorveu se casá. Mas Chica da Silva, tinha outros pretendentes e convenceu a princesa a se casá
com Tiradentes.”
Enquanto a pílula não vem, aprendam
o restante do samba pode ser aprendido
ou canibalizado. É muito interessante. Para terminar vou transcrever o que meu
amigo João Claudio Todorov (2014) escreveu em seu Blog: “ Há pessoas que
escrevem com a tranquilidade dos que são felizes porque não sabem que não
conhecem o assunto”.
Referencias
Hartry, A. L; Keith-Lee, P. and Morton, W.
(1964). Planaria Memory transfer through cannibalism reexamined. Science, New
Series, Vol. 146, N° 3641. (Oct. 9,) pp. 274-275.
Jenkins, H.M. (1977). Sensitivity of Different
Response System to Stimulus-Reinforcer and Response-Reinforcer Relations.In
Hank Davis & Harry M. B. Hurwitz. Cap. 3. New York ; John Wiley & Sons.
Mc Connel, J. V. (1962). Journal
Neuropsychiatry, 3 (Suppl. 1) S 42.
Pavlov. I.P. (1927) Conditioned Reflexes . tr.
G.V. Anrep.London: Oxford University Press.
Porto, S. (1968).
Na Terra do Crioulo Doido: a máquina de fazer doido. Editora Sabia: Rio de
Janeiro.
Sidman, M. (1960). Tactics of Scientific
Research. Cap. 11. New York: Basic Books, Inc.,Publishers.
Sidman, M. & Tailby, W. (1982). Copnditioned
discrimination VS matching to sample: an expansion of the testing paradigm.
Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 37 (1), 5-22.
Terrace, H.S. (1963).Discrimination learning
with and without “errors”. Journal Experimental Analysis of Behavior, 1963, 6,
1-27.
Todorov, J. C.
(2014). http://www.jctodorov.blogspot.com.br/2014/03/comportamento-ma-fe-e-ignorancia.html
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