quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Modelagem na Análise do Comportamento – Como não ensinar seu filho, como não treinar seu rato

            . Dois artigos recentes no New York Times mostram a importância de um esclarecimento continuo do público sobre o que e’ Analise do Comportamento. Um tratava de consequências arbitrarias como suborno – você não pode reforçar seu filho por ler ao invés de jogar vídeo games, isso e’ suborno, propina, pixuleco. Ele tem que descobrir os prazeres da leitura sozinho. Outro artigo está no The New York Times Magazine de 31 de julho de 2016, e diz como ensinar um rato. O entrevistado tem currículo para falar do assunto pois treinou milhares de ratos para filmes como ‘’Bram Stoker’s Dracula’’ e ‘’Willard’’ e séries da televisão como ‘’True Blood’’.
            Sobre consequência condicional como suborno: o tesoureiro do partido do governo avisar o empresário que seu contrato com o governo só será assinado se doar recursos para o partido e’ situação de extorsão (ato do tesoureiro) e propina ou suborno (ato do empresário). A mãe estabelecer que o tempo livre para brincar depende de 30 minutos lendo e’ parte de inúmeras outras relações condicionais que a cultura determina que devem ser ensinadas – como lavar as mãos antes de comer, escovar os dentes depois das refeições, tomar banho no fim do dia, etc. Todas são relações condicionadas arbitrarias.
            Se eu escrevesse aqui que você não pode subornar seu filho estabelecendo lavar as mãos antes das refeições como condição para almoçar, os leitores achariam que estou ficando doido.
            Já’ o artigo sobre como ensinar o rato e’ um exemplo de difusão de informação errada. A razão para usar comida como consequência para modelar comportamentos está errada, parece que de proposito, para tornar o procedimento mais palatável ao público – seria melhor para a saúde do rato ter que trabalhar para comer do que ficar na gaiola engordando por comer demais sem se exercitar. O uso de reforço condicionado (um ‘clique’ produzido por um artefato de metal que você segura na mão) também e’ mal explicado – você começa por estabelecer contato amigável com o rato, segurando-o e fazendo carinho, ate’ que a inundação de respondentes no bicho se acalme. Quando ele estiver calmo o suficiente para ter fome, as pelotas de alimento são dadas e seguidas pelo clique. O clique vem depois da comida para que esse novo som não assuste do animal.
            Estabelecido o clique como estimulo neutro começa a associação clique-comida. De início um clique e’ sempre seguido por comida, mas logo essa relação vai sendo alterada de tal maneira que e’ possível exibir um desempenho complexo mantido apenas por reforço condicionado produzido por um aparelho escondido na mão do treinador.  Até ai’ tudo bem. A explicação do treinador e’ que atrapalha. Diz ele: “Comece a associar o clique e a comida para que o rato entenda a relação de causa e efeito”.  “Aumente a distância entre o som e a comida ate’ que o rato perceba que o som e’ uma promessa de comida”. Mas não espere mais que 30 segundos depois do clique para dar a comida”. “Sessões de 10 minutos são mais proveitosas”.
            Ai’ esta’ o que acontece quando métodos e técnicas desenvolvidos pela Análise do Comportamento são usadas por quem não tem formação teórica adequada. O relato antropomórfico e’ desnecessário, supérfluo e errado. Informações técnicas mostram despreparo. O texto a seguir mostra como funciona a modelagem de longas cadeias de respostas em ratos. Foi publicado em outra postagem neste blog –
jctodorov.blogspot.com/2010/05/operantes-complexos.html
Eis o que apresentei na reunião da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência – SBPC - ocorrida em Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, em julho de 1964 (Todorov, J. C. “Brasilino II: uma demonstração de encadeamento de respostas”.).

Brasilino II trabalhou (e fez seu professor trabalhar) uma hora por dia durante 30 dias para completar um encadeamento de 21 componentes. O último componente era pressionar uma barra dentro da caixa experimental e receber água como consequência. O primeiro era deixar a caixa experimental e se dirigir para uma escada vertical que o levava para o alto de uma estante com estrutura de barras de alumínio com1, 50 m de altura, com três prateleiras. No meu site https://sites.google.com/site/jctodorov/ a primeira foto mostra sua chegada na plataforma superior, dirigindo-se em alta velocidade para uma seqüência de pinos de metal que deveria ser percorrida, um pino pela esquerda, o seguinte pela direita, etc. Outros componentes incluíam saltar um aro de metal colocado a 15 cm do piso (a parte de baixo do aro aparece na foto no alto à esquerda), correr para uma plataforma e saltar o espaço vazio até a plataforma de descida (um pedaço da primeira plataforma aparece também no alto da foto à esquerda), descer pela escada lateral para a prateleira de baixo, etc., até um labirinto que tomava todo o piso inferior, penúltimo de 21 elos da cadeia.

Brasilino II foi treinado da frente pata trás, isto é, aprendeu primeiro a pressionar a barra para beber água. Em seguida aprendeu que a pressão à barra só era seguida por água quando uma campainha estivesse soando. Em termos técnicos, na contingência tríplice água foi o estímulo reforçador primário, pressão à barra a resposta operante e a campainha o estímulo discriminativo. O próximo passo foi usar a campainha como estímulo reforçador condicionado para a resposta de sair do labirinto e dirigir-se para a caixa experimental. O rato era colocado, sem som, na saída do labirinto e o som começava a tocar quando ele se dirigia para a caixa. Da mesma forma aprendeu para que lado virar em cada esquina do labirinto (havia cerca de 15 escolhas entre esquerda ou direita que tinha que fazer). Qualquer erro fazia o som parar, e o som só recomeçava quando Brasilino II retomava o caminho certo.

Brasilino II foi inspirado no rato Barnabus, ensinado por meu professor na USP J. Gilmour Sherman,(quando estudava na Columbia University de Nova Iorque, nos anos 50).

Comparações entre ensinar cadeia para trás, como fizemos com o Brasilino II, ou para frente, tem sido publicadas:

Borges, M. M., Simonassi, L. E., & Todorov, J. C. (1979). Comparação de dois procedimentos na aquisição de cadeias de respostas em humanos. Anais da IX Reunião Anual da Sociedade de Psicologia de Ribeirão Preto, p.107.

Borges, M. M. (1982). Efeitos de dois procedimentos na aprendizagem de cadeias comportamentais. Dissertação de Mestrado, (Psicologia), Universidade de Brasília.

Borges, M. M. & Todorov, J. C. (1985). Aprendizagem de cadeias comportamentais: uma comparação entre dois procedimentos. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 1 (3), 237-248.




2 comentários:

  1. Muito bom! Mas, no caso da mãe que "suborna" o filho, é controvérsio pq para ela parece ser um reforço, porém as contingências para alguém que está sendo "obrigado" a ler podem se tornar aversivas.
    Sobre os encadeamentos, esse tipo de modelagem demonstra quais relações contingenciais com o ser humano em contexto cultural?

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  2. http://jctodorov.blogspot.com/2015/07/transferencia-condicionada-de-renda.html

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