Assim
como a tolerância para com o diferente, nossos valores nos são dados pelas
pessoas com as quais convivemos a partir do nascimento. São esses valores que
podem nos levar a escolher dirigentes capazes de, entre outras coisas “criar
clima de harmonia entre todos”.
O BODE
Admitamos
que não foi de caso pensado. O Cunha foi eleito pelo baixo clero da Câmara por
soberba e incompetência política de quem tinha a maioria. Vontade de hegemonia
muitas vezes dá nisso. A situação lembra a história do bode na sala, pois a
rejeição ao Cunha veio a calhar.
Há no folclore político a lenda do camarada russo, fiel militante do partido
único, que morava com a mulher e os filhos em um apartamento de quarto e sala
cedido pelo partido. De tanto insistir para receber autorização para se mudar
para um apartamento maior sem receber resposta o camarada finalmente foi
chamado para receber nova missão: manter e cuidar de um bode na sala de seu
quarto-e-sala.
O bode na sala mudou completamente vida do camarada. Se antes a mulher e os
filhos não paravam de dizer que queriam se mudar para um apartamento maior,
agora tinham nova e mais urgente reivindicação: tirar o bode da sala.
O BODE EXPIATÓRIO
Pois não é que tem muita gente que se esqueceu de pedir o impedimento da
presidente depois que foi iniciada a campanha “Fora Cunha”? Estão até pedindo
ao STF que atue como o coletivo da história e retire o Cunha, perdão, o bode,
da sala. Mesmo os militantes que constrangidos repetiam que pedalada não é
crime agora ficaram felizes com a tarefa de ajudar a tirar da presidência da
Câmara um político no mínimo cara de pau.
Sobre pedalada não ser crime: se fosse, a presidente seria julgada pelo STF.
Mas pode ser crime de responsabilidade, a ser conferido pelo Congresso, como
previsto na Constituição. O único golpe à vista é o publicitário, com novo
ataque da novilíngua: se for contra nós, impeachment é golpe. Esse
investimento em propaganda para desviar a atenção da militância gera o clima de
conflito e intolerância, vermelhos contra amarelos, radicalizado: tudo o que
não for vermelho por definição é amarelo. O país não merece esse clima de
guerra.
A INTOLERÂNCIA
Indivíduos
pacíficos e tolerantes são formados por ambientes acolhedores a partir da concepção:
mulheres grávidas que bebem demais, que fumam demais, que sofrem demais,
viciadas em tóxicos, ou que sejam acometidas por certas doenças, não fornecem a
seus futuros bebês ambientes necessários para seu pleno desenvolvimento.
Práticas
culturais para a socialização da criança baseadas em coerção não geram
indivíduos nem pacíficos nem tolerantes. Muitas escolas começam a agredir a
criança a partir de sua arquitetura, em ruínas, sujas, desconfortáveis, e de
sua exposição a interações baseadas em fuga e esquiva: o bullying é mais
frequente do que se pensa, e tem as mais diversas formas.
Quem
faz o indivíduo é o coletivo, formado por indivíduos também formados por outros
coletivos anteriores. Práticas culturais que definem um grupo são transmitidas
por meio de regras, exemplos e exposição direta a consequências. A criança
sendo socializada hoje será o socializador de amanhã.
“Paz não é apenas a ausência de guerra entre os países. Paz
é garantir que todas as pessoas tenham moradia, alimento, roupa, educação,
saúde, amor e compreensão. Paz é cuidar do ambiente em que vivemos, garantir a
qualidade da água, o saneamento básico, a despoluição do ar, o bom
aproveitamento da terra. Paz é buscar serenidade dentro da gente para viver com
alegria. Paz é a capacidade de se criar clima de harmonia entre todos,
lembrando-se sempre de que onde existe amor, existe paz”. (Texto entre aspas é
de Isaac Roitman, da Academia Brasileira de Ciências).
Assim
como a tolerância para com o diferente, nossos valores nos são dados pelas
pessoas com as quais convivemos a partir do nascimento. São esses valores que
podem nos levar a escolher dirigentes capazes de, entre outras coisas “criar
clima de harmonia entre todos”.
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