domingo, 11 de outubro de 2015

Prefácio de Elenice Hanna para "A Psicologia como o Estudo de Interações".


Os textos compilados neste livro ilustram parte da grande contribuição que João Claudio Todorov tem dado à psicologia, e por suas publicações em português, à psicologia no Brasil. A sua primeira grande contribuição, ainda como aluno, foi traduzir em 1964/1965, junto com Rodolpho Azzi, o livro Ciência e Comportamento Humano de B. F. Skinner (publicação original datada de 1953, tradução publicada em 1967 pela Editora Universidade de Brasília). Como grande divulgador da análise do comportamento no Brasil, professor e pesquisador de renome internacional, João Claudio Todorov é um dos autores brasileiros mais citados e lidos nos cursos de psicologia.

A maior parte do livro Psicologia Como Estudo de Interações foi escrita no final da década de 80 como material didático que comporia um livro didático. O material acabou sendo publicado como artigos em diferentes periódicos, mas a ideia do livro foi retomada quando uma aluna de destaque de Todorov da Universidade de Brasília (Maísa Moreira) se prontificou a digitar vários dos capítulos. Em 2008 a ideia do livro foi retomada, agora com a ajuda de Márcio Borges Moreira, ex-aluno e então colega de trabalho de Todorov no Instituto de Educação Superior de Brasília - IESB, que revisou e organizou o material já digitado com auxílio da aluna Ana Claudia Peixoto Leal. O convite do Márcio à Todorov para publicar o livro pelo Instituto Walden4, atualmente uma fonte importante de material didático em análise do comportamento, foi aceito prontamente.

O título do livro Psicologia Como Estudo de Interações não poderia ser mais abrangente e, além de fazer jus à abrangência das publicações do autor que vai “da Aplysia à Constituição”, marca um dos mais impactantes artigos escritos pelo autor. Ainda me lembro da primeira vez que li este artigo (Capítulo 1), ainda como aluna de graduação da Universidade de Brasília, realizando pesquisas com o professor Todorov no Laboratório de Análise Experimental do Comportamento. O artigo, ainda em forma de manuscrito datilografado, deixou a mim e aos meus colegas impressionados com a forma como o texto consegue, não apenas mostrar a proposta da análise do comportamento de ter como objeto de estudo as interações, mas de integrar a psicologia em torno dessa visão. Apesar de sua primeira publicação datar de 1989, o texto continua atual e é parte das referências de programas de disciplinas de bons cursos de psicologia. O vídeo do eBook (www.walden4.com.br/pww4) com a entrevista do autor, além de complementar as informações sobre os assuntos tratados no texto, relata a metodologia de ensino baseada na análise do comportamento, que foi implantada no IESB na época em que Todorov era coordenador do curso de graduação. O papel do professor no Sistema Personalizado de Instrução (PSI), como salienta o autor, é de gerenciar o sistema de aprendizagem e não de apresentar oralmente a matéria, o que garante o papel ativo do aluno no processo de aprendizagem. Nessa proposta, o cuidado com a preparação do material didático é muito importante, pois é a partir dele que a motivação, compreensão, curiosidade e questões de interesse devem surgir. Quem teve o privilégio de ser aluno do Prof. Todorov sabe que ele realmente cria contingências para o aluno ser ativo no processo de aprendizagem.

A clareza conceitual do grande mestre e sua vasta experiência como pesquisador permeia toda a sua produção, inclusive a selecionada para este livro. Cinco capítulos são contribuições do autor sobre a linguagem e os conceitos da análise do comportamento. O segundo capítulo Behaviorismo e Análise Experimental do Comportamento é leitura essencial para compreender e diferenciar termos básicos e conceitos da análise do comportamento e psicologia comportamental, bem como seus pressupostos. Publicado em 1982, o artigo complementa o anterior ao esclarecer a filosofia behaviorista e a proposta da análise do comportamento.


O conceito de contingência, detalhado no terceiro capítulo, é básico, mas difícil de ser compreendido para iniciantes do curso de psicologia. A explicação do conceito, citando os vários tipos e pesquisas que utilizam diferentes contingências, mostra a sua abrangência e aumenta a possibilidade do leitor compreender a importância e utilidade do conceito tanto como instrumento de análise quanto como variável independente. Todorov amplia o uso do termo, que é utilizado por Skinner no contexto de condicionamento operante apenas. Este é um texto que deve ser relido em momentos diferentes do curso por aqueles que se interessam pela análise do comportamento e por pesquisa. O autor discorre, no capítulo quatro, sobre a evolução do conceito de operante desde a década de 30, como uma definição negativa a partir do que não é reflexo, até o uso mais aceito ainda hoje baseado nos três termos da contingência tríplice. A contingência tríplice, por ser considerada a unidade principal de análise na Analise do Comportamento, mereceu um texto específico. Esse capítulo é um dos que mais aprecio pela clareza como coloca os conceitos, pela forma como coloca a noção de multideterminação do comportamento, por tratar da relatividade da função dos eventos ambientais e do conceito de contexto. O Capítulo 6 (Da Aplysia à constituição: evolução de conceitos da análise do comportamento) reapresenta a evolução dos conceitos de respondente e operante, mas esse texto é apresentado de maneira diferenciada dos acima e o torna especialmente interessante: Todorov menciona fatos da história de vida e formação de Skinner para se compreender as propostas de mudanças conceituais e claramente estrutura o texto para que a visão do comportamento como produto de três níveis de seleção seja compreendida. Nesse texto, pela primeira vez, o autor passa a mudar seu olhar com maior direção para a seleção cultural. Importante mencionar, entretanto, que a visão global sobre as influências do comportamento está presente em muitas apresentações e atuações de Todorov em diferentes contextos sociais (Sociedades Científicas, Conselho de Psicologia, para citar alguns), mas a ênfase da seleção cultural na sua produção escrita é mais recente. 

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